segunda-feira, 4 de novembro de 2013

IDADE PENAL: Reduzir pra quê?* Jardel Santana


Por Jardel Santana**

Todas as vezes que ocorrem crimes bárbaros, cometidos por adolescentes e com repercussão na mídia, ressurge a polêmica acerca da idade penal e se defende sua redução, como se essa fosse a solução para os problemas da criminalidade no Brasil.
Conforme dados do Ministério da Justiça, dentre os/as adolescentes em conflito com a lei, que já cumprem medida socioeducativa, cerca de 43,7% cometeram crimes patrimoniais (furto e roubo); 26,6% tiveram envolvimento com tráfico de drogas; 8,4% cometeram homicídio; e 1,9% latrocínio. Os crimes patrimoniais e de tráfico de drogas, também são os responsáveis pelo maior número de encarceramento de pessoas com idade acima de 18 anos, o que leva a crer que os/as adolescentes que cometeram atos infracionais, serão encarcerados em ampla maioria não por cometerem crimes contra a vida, mas por furtarem ou se envolverem em tráfico de drogas.
Acreditar que o/a adolescente infrator/a não pode ser responsabilizado/a é uma ilusão propagada pela mídia. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, não propõe impunidade, ao contrário, prevê seis diferentes medidas sócio-educativas. No caso de maior gravidade, o/a adolescente pode cumprir medida sócio-educativa de privação de liberdade. Por isso, não se deve confundir o limite fixado para a idade penal, com a ideia de tirar a responsabilidade do/a adolescente. O termo inimputável, não é sinônimo de impunidade e o/a adolescente que comete ato infracional, apesar de inimputável, é responsabilizado/a conforme o ECA, que é uma legislação especial, a qual leva em conta a condição peculiar de desenvolvimento do/a adolescente.
O debate da redução da idade penal desvia o foco das principais e reais causas da violência, tendo como destaque a ausência do direito ao trabalho e ao salário justos; o consumismo, tão fortemente propagado pela mesma mídia que defende a redução da idade penal; a impunidade e o fracasso dos mecanismos de controle social; e principalmente, a desigualdade social. O Brasil ocupa a 84ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano, entre 169 países pesquisados, com a pior colocação na América Latina.
Enfrentar a violência exige uma série de medidas, principalmente preventivas, e não somente se pensar na redução da idade, pois apoiar tal medida é colaborar para a criminalização da pobreza, tendo em vista que quem irá preso/a, na maioria dos casos, serão os/as adolescentes pobres, considerando a realidade da população carcerária brasileira, a qual é composta majoritariamente por empobrecidos/as. Dos/as encarcerados/as, 95% são absolutamente pobres, 89% nunca tiveram emprego fixo ou atividade produtiva, 70% deles/as não completaram o ensino fundamental e 10,5% são analfabetos/as.
Dentre os antídotos contra a violência, talvez o melhor seja a lei, entretanto ela quase não é lembrada, quando as crianças e adolescentes não conseguem vagas em creches ou escolas de qualidade; quando não conseguem tratamento de saúde; quando são vítimas de violência, muitas vezes causadas pelo braço armado do estado; quando não conseguem oportunidades de profissionalização, educação e acesso à aprendizagem e ao mercado de trabalho, com salários dignos e que supram suas necessidades; quando são privados de acesso à cultura, ou pior, quando tem sua cultura marginalizada; enfim, quando os seus direitos são violados. As principais vítimas de violência e da exclusão social no Brasil são crianças, adolescentes e jovens.
Segundo dados do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), são assassinados/as 16 crianças e adolescentes por dia no Brasil. A taxa de homicídio de crianças e adolescentes, no ano 2000 era de 11,9 para cada 100 mil crianças e adolescentes do país e em 2010 passou a ser de 13,8. O Mapa da Violência 2013: Homicídios e Juventude no Brasil, destaca que a média anual de homicídios envolvendo jovens, por grupo de 100 mil habitantes, teve aumento de 185,6%, saindo de 54,8% em 2001, para 156,4% em 2011.
Outro fator interessante, que não é apresentado na grande mídia, diz respeito à reincidência, enquanto no sistema prisional (para as pessoas com idade acima de 18 anos) chegam a 60%, em projetos socioeducativos que cumprem a lei, os índices são de menos de 5%, demonstrando, portanto, que os/as adolescentes, estão mais propícios/as à ressocialização, principalmente se receberem tratamento adequado, o qual não é a privação de liberdade.   
Continuar acreditando nesse modelo de justiça retributiva (com foco na prisão do individuo) em detrimento ao modelo de justiça restaurativa (foco em medidas alternativas), é ingenuidade, pois há dados mais que suficientes comprovando o fracasso do modelo retributivo. Por isso que é necessário no Brasil, o devido cumprimento do ECA; do recém aprovado, estatuto da juventude; a efetiva implementação do Sistema Nacional de Atendimento Sócio Educativo – SINASE e principalmente, a diminuição das desigualdades sociais, pois o presente e o futuro do Brasil, não merece cadeia.

*Texto publicado na 10ª Edição (impressa) do Jornal O Miraculoso - http://www.miraculoso.com.br/

**Graduando em Psicologia, militante da Pastoral da Juventude e dos Direitos Humanos, nas causas das juventudes.

Um comentário:

  1. É por isso que o Jardel foi convidado a ser membro da comissão de Direitos Humanos do CRP 01 - BRASILIA -
    Edmar Carrusca

    ResponderExcluir