quinta-feira, 5 de maio de 2016

O cenário que se desenha hoje - Pedro A. Ribeiro de Oliveira*


 – IHU, 26 de abril de 2106**
            Exponho meu pensamento de modo afirmativo, mas deixo claro que a tese que o perpassa – a derrota do projeto nacional-desenvolvimentista brasileiro – é somente uma hipótese. Hipótese pessimista, mas capaz de abrir uma perspectiva otimista para a ação, como recomendava o mestre Gramsci.
            Temos que decifrar o que está acontecendo por detrás dos jogos de cena onde aparecem os agentes visíveis (políticos, policiais, juízes, comunicadores, líderes sociais, agentes religiosos, etc), porque eles e elas estão a serviço de alguma classe social. E o que conta na estrutura social são os projetos e a visão que cada classe procura impor como se fossem de toda a sociedade. Dessa análise devem resultar pistas adequadas para levar adiante um projeto para o mundo, porque não há neutralidade possível nesse jogo/luta pelo poder. Esta análise só tem sentido se for útil às classes dominadas e grupos oprimidos.
            Meu ponto de partida é a consideração da crise mundial do capitalismo, porque o Brasil está na periferia do sistema capitalista mundial e, como sempre acontece, é sobre a periferia que recai o ônus maior da crise mundial. A crise de 2008 não terminou. A financeirização do capital é sintoma de crise de longa duração, como mostra a história de 5 séculos de capitalismo. Durante todo esse tempo o capitalismo só consegue superar suas crises de superprodução por meio da “destruição criativa” = guerra de onde emergirá o polo dinâmico do novo ciclo de acumulação. Do norte da Itália (s. 15) para Amsterdã (s. 16-17), depois Londres (18-19), atualmente N. Iorque e no futuro talvez Pequim. Hoje existe nova forma de guerra: a “guerra não-convencional” que pode destruir um país sem recorrer à força das armas, porque usa instrumentos políticos, policiais e judiciais amparados por intensa desinformação midiática (TVs, rádios, jornais e principalmente redes sociais operadas por agentes treinados para a provocação). É só lembrar os que os EUA fizeram no Afeganistão, Iraque, Líbia, Egito e Síria, bem como os golpes dados em Honduras e Paraguai. Isso, quando não conseguem vencer a eleição e colocar seu agente no governo (Macri, na Argentina). A política externa de Lula e Dilma, de aproximar-se da China e favorecer a integração sul-americana certamente contraria os interesses geopolíticos dos EUA.
            O objetivo dessa operação de “guerra não-convencional” é quebrar a espinha dorsal do capitalismo brasileiro (BNDES, bancos e empresas estatais, grandes empreiteiras) e passar seu controle às megaempresas mundiais. As classes dominantes do Brasil – não mais de 100.000 famílias – aceitam esse projeto porque são, desde a colonização portuguesa, o sócio minoritário do capital externo. Embora elas tenham sido beneficiadas pelo modelo nacional-desenvolvimentista financiado pelo Estado, agora renunciam a esse modelo e submetem-se docilmente ao neoliberalismo imposto pelos grandes conglomerados corporativos transnacionais que mandam no mundo. A política de equilíbrio fiscal por eles imposta reduz drasticamente a capacidade de intervenção do Estado na economia, deixando que ela seja regulada apenas pelo mercado. O 2º governo Dilma curvou-se a essa política de equilíbrio fiscal, mas conseguiu manter políticas sociais que protegem as classes economicamente desprotegidas. Agora as classes dominantes mostram sua decisão de acabar até com essa pequena proteção do Estado aos pobres.
            Nesse quadro mais amplo fica claro o papel desempenhado (intencionalmente ou não) por Temer, Cunha, Bolsonaro, Moro, Gilmar Mendes, Serra, FHC e outros atores que tomaram a frente do processo de aniquilamento do PT e do esvaziamento de suas lideranças. Trata-se de colocar o País de joelhos diante das megaempresas que virão completar o processo de colonização da nossa economia, com a aprovação das classes dominantes. O problema é grave porque os governos Lula e Dilma jogaram toda sua força na política nos programas que tiraram quase 50 milhões de pessoas da miséria, expandiram a demanda, estimularam investimentos e aumentaram muito o nível de emprego, mas não foram acompanhadas pelo aumento da organização política popular nem pela tributação das classes dominantes, que continuam a concentrar a renda e a riqueza. Hoje as classes populares têm menos meios de expressão e de representação de seus interesses no espaço público do que tiveram durante a década de 1980. Já as classes dominantes romperam unilateralmente o pacto social que está na base da Constituição de 1988, esvaziando-a de direitos sociais conquistados. O atual golpe de 2015-16 vem completar esse processo de cassação de direitos de cidadania para as classes subalternas. As grandes manifestações de 2013 deixaram isso evidente: amplos setores incluídos no mercado de consumo, mas excluídos da cidadania, como a juventude, foram às ruas protestar. Como seu protesto não foi atendido, a insatisfação das novas gerações tem crescido, como mostram as ocupações de escolas públicas. Novos e antigos movimentos – os Sem-Teto, Povos indígenas, MST, movimentos contra barragens, ambientais, LGBT e outros – expressam essa insatisfação social que busca uma solução que não passa pelo canal das eleições.
            Por tudo isso, é importante resistir ao golpe. Estão sendo preparadas manifestações populares no 1º de maio e quem defende a democracia não poderá faltar. Mas devemos pensar a possibilidade de êxito do golpe e a consequente conquista do Estado brasileiro por grupos alinhados com as megaempresas. Seria imprudente jogar todas as forças na resistência ao golpe, pois correríamos o risco de sofrer uma derrota atrás da outra até o completo aniquilamento. Há que se pensar uma estratégia de retirada que preserve pelo menos parte de nossas forças para lutar contra a devastação social, econômica, moral e ambiental que se anuncia. Com o realismo de Darci Ribeiro – que no final da vida disse “perdi muitas batalhas, mas nunca quis me colocar ao lado dos vencedores” – deveremos reconhecer a derrota política das classes populares para traçar uma estratégia inteiramente nova.
            Para isso precisamos levar em conta um fator até hoje pouco considerado em nossas análises de conjuntura social, política e econômica: o fator ambiental. Tudo indica que o ano de 2014 marca o início do período de rápido aquecimento global. A reunião mundial da COP-21, em Paris, reconheceu haver risco de agravar-se o aquecimento, mas ficou nas boas intenções. (Se o aquecimento global fosse levado a sério as corridas de automóveis já estariam proibidas). Provavelmente antes de 2050 enfrentaremos uma situação calamitosa: num verão quente, haverá escassez de água, de eletricidade e de alimentos. O que acontecerá nas médias e grandes cidades? O Estado já desmantelado não terá meios para controlar o mercado e impor um sistema de distribuição de bens escassos. Provavelmente sua ação se limitará a reprimir os protestos populares. O que esperar, senão o caos social?
Ainda não vislumbramos uma estratégia eficaz para enfrentar e superar essa crise social e ambiental que se anuncia em âmbito planetário. A lógica do capital, apoiada na tecnociência, despreza os limites ambientais e se considera invencível, como se a Terra também reconhecesse o valor do dinheiro. Essa lógica fará o mercado capitalista (talvez conduzido pela China) devorar todos os bens do Planeta, transformando-os em objeto de compra e venda, até o esgotamento dos recursos que por tantos milênios favoreceram o desenvolvimento da vida. Exausta, a Terra deixará de ser nossa casa comum e vai tornar-se um planeta inóspito para a espécie humana. É ainda possível impedir que isso ocorra?
Já está em curso essa busca de um outro modo de produção e consumo, mas é necessário acelerar seu ritmo e dar-lhe alcance planetário para que ela seja capaz de evitar a catástrofe. Mais importante do que saber se ainda há tempo para reverter o processo, é fundar desde já as bases de uma sociedade alternativa. Se ela se consolidar a tempo de salvar a humanidade, melhor; mas se o tempo não for suficiente para isso, os sobreviventes terão pelo menos as bases sobre as quais construir uma forma de sociabilidade respeitosa da Terra, onde a espécie homo sapiens viva em paz consigo mesma e com as demais espécies. O pior, de fato, seria a inação: por descrença na possibilidade de conversão da humanidade, legar à futura geração um Planeta devastado e com parcas condições de vida.
Penso que hoje é imperioso desenvolver a espiritualidade política libertadora como a forma de espiritualidade cristã (e também de outras tradições religiosas) mais necessária para o mundo. Não sei avaliar até que ponto as Igrejas cristãs serão capazes de nos ajudar a vivenciar essa forma de espiritualidade, porque parecem só se ocupar de felicidade depois da morte. Mas se, com Pedro Casaldáliga, afirmamos que “queremos terra na Terra, já temos terra no Céu”, temos que buscar uma espiritualidade terrenal, uma espiritualidade que anime as lutas pela vida da Terra como casa comum que abriga a humanidade e todas as espécies vivas. Os Direitos da Mãe Terra e o Direito dos Animais não podem ser descartados como ocorre hoje. A espiritualidade política deve inspirar uma outra visão de mundo, onde a humanidade se integre na grande comunidade de vida do Planeta. Este é, em síntese, o propósito do Bem-viver: mais do que utopia, é verdadeira Sabedoria de Vida.
**http://www.ihu.unisinos.br/noticias/554129-o-cenario-que-se-desenha-hoje


Elementos para uma análise de conjuntura política

 Maio 2016

I.          Contexto Histórico

1.      Depois de derrotarmos o neoliberalismo, e passarmos dez anos de neodesenvolvimentismo, houve um esgotamento desse modelo.
2.      Há uma crise histórica e profunda de natureza: Econômica, Política, Social, Ambiental e de valores.
3.      Há uma crise do modo capitalista internacional – eles não têm saída a curto prazo. E a economia brasileira, periférica, subordinada a eles, é utilizada para aumentar a exploração dos trabalhadores e espoliação das riquezas naturais.
4.      As saídas serão prolongadas e conflitivas, pois dependem de articulação de um novo projeto a ser articulado pelas forças sociais.
5.      O capital internacional e nacional vão disputar todas as possibilidades de acumular capital no Brasil. E suas prioridades serão apropriar-se do petróleo (representa uma renda extraordinária de 200 bi de reais por ano); minérios; previdência social (mercantilizá-la para se apoderar da poupança dos trabalhadores); energia elétrica (pois várias hidrelétricas poderão ser privatizadas com renda extraordinária) e ainda privatização de diversas empresas e bancos públicos transformando-as em sociedades anônimas e por último privatizar serviços públicos que podem dar lucro na educação: saúde,etc).
6.      Para que o capital retome suas taxas de lucro e volte a acumular, só tem o caminho de diminuir o custo do trabalho, ou seja, retirar direitos dos trabalhadores, diminuir salários, etc.
7.      A médio prazo, a classe trabalhadora só poderá conter a volta do neoliberalismo e  construir seu próprio projeto com amplas mobilizações de massa e com o reascenso do movimento de massas em geral.

II.    O enfrentamento atual na luta de classes

1.       A Luta de Classes se acirrou na sociedade
a) Há disputa política e ideológica em cada espaço.
b) Acabou a posição de centro e com ele a política de conciliação de classes, que o PT/PcdoB e o governo aplicaram nos últimos anos.
c) A extrema direita ganhou espaços de influência ideológica na atual conjuntura, seja nas manifestações e nas redes (Bolsonaro, etc.), porém tem influência maior entre os mais ricos e não em toda sociedade.
d) Nas últimas semanas brotaram inúmeros atos, manifestos de setores influentes da sociedade, como energias progressistas, que estão enfrentando a hegemonia da Globo. E a votação do dia 17 de abril despertou entre a maioria da sociedade um sentimento de indignação contra o golpe legislativo-judiciário.
e) O futuro governo Temer-Cunha é um enigma, pois por mais que tenha conseguido aglutinar o poder econômico, a mídia e os parlamentares, tem apenas 8% de apoio na sociedade. Vai aplicar um programa neoliberal. Reunificou todas as forças partidárias conservadoras, reeditando o velho centrão que vem desde a constituinte. Mas ninguém sabe como serão as reações da população, que eles não controlam.


2.       Objetivos da direita/dos capitalistas
a) Recolocar o projeto neoliberal e subordinar nossa economia aos EUA. (Isso significa recompor as taxas de lucros, reduzir direitos dos trabalhadores, se apropriar de recursos públicos, privatizar mais empresas publicas, etc. Ou seja, colocar a exploração do trabalho em novo patamar para eles poderem sair da crise e voltarem a acumular. Para isso, será necessário:
b) Derrotar o governo Dilma.
c) Impedir a possibilidade de ter Lula como candidato em 2018, (pela via da desmoralização, ou mesmo transformá-lo em ficha suja, por alguma prisão fajuta)
d) Derrotar o PT e a Esquerda como proposta política alternativa de sociedade frente à crise do capitalismo.
e) E nesse contexto ir implementando as medidas neoliberais na sociedade, via Congresso, Judiciário, mídia.  Criar uma nova hegemonia ideológica na sociedade.

3.       A Direita está dividida na sua direção política entre os seguintes pólos, que podem se aglutinar ou disputarem entre si:
a) Frente Partidária - PMDB/PSDB/DEM, mas os partidos não tem representatividade na sociedade, apenas controlam as máquinas institucionais. E todos eles estão envolvidos também na corrupção e na operação lava-jato.
b) O Poder econômico – das empresas (têm também varias frações entre eles, alguns defendem o neoliberalismo e o golpe, outros sonham com neodesenvolvimentismo e outros não sabem para onde ir).
c) Núcleo ideológico: MPF + PF + Moro + Globo (agem por motivação político-ideológica e sem articulação com as demais frentes).
Nos próximos embates, podem emergir muitas contradições entre as três frentes de comando político deles, que precisamos explorar.

4.       Desfechos possíveis
a) As divisões nas articulações da direita podem levar ainda a diferentes desfechos.   Mesmo com a retirada da Presidenta Dilma, teremos 120 dias de muita disputa e ninguém sabe o que vai acontecer até as eleições de 2018.
b) Eles não podem jogar a operação lava-jato debaixo do tapete. E ela pode impugnar mais de cem parlamentares e vários dirigentes expressivos da direita e inviabilizar diversas empresas.
c) É possível que haja uma desmoralização geral da política. E se houver mobilizações e reascenso do movimento de massas, os temas da reforma política, da Assembleia Constituinte e da realização de novas eleições gerais, podem ganhar força política na sociedade.
d) Há duvidas se o governo Temer terá coragem de criminalizar os movimentos  populares, começando pelo MST. Pois será também um governo de crise permanente até as eleições de 2018, já que é um governo ilegítimo. O mais provável é que mescle medidas econômicas neoliberais, como pequenos agrados aos mais pobres.
e) E em relação aos movimentos organizados da classe trabalhadora, a criminalização virá pela mídia, pelo legislativo (com CPIs do Incra, da UNE da CUT)  e liberando as forças direitistas nos estados para realizarem a repressão, numa mescla da PM com os setores truculentos da burguesia e seus capangas (como já deram sinais no Paraná).

III- DESAFIOS e Necessidades da classe trabalhadorapara enfrentar a luta de classes :

1.        Debater na FBP (Frente Brasil popular) e com todos setores da classe e  aliados a necessidade de avançar nas paralisações, greves e mobilizações para enfrentar o capital. E, explicar para o povo a natureza do golpe e porque eles precisam a volta ao neoliberalismo.
2.        Enfrentar e denunciar a rede Globo, que é hoje o centro da direção político-ideológica da direita.
3.  A classe trabalhadora/FBP precisa ter uma pauta mais clara, um Plano de Emergência para além da defesa da legalidade do Governo, para dialogar com as massas, explicar a disputa de projetos entre: a volta do neoliberalismo ou avançar mais além do neodesenvolvimentismo.  Precisamos construir uma CARTA DO POVO BRASILEIRO para a sociedade, com dez, doze pontos bem claros.
4.  Melhorar as formas de se comunicar com as massas. Denunciando a corrupção de todos os políticos e mostrando a necessidade de uma reforma política, exigindo mudanças na política econômica e nas políticas publicas para melhorar as condições de vida da população. Defender a soberania nacional, ou seja, que as riquezas naturais (petróleo, minérios, energia) sejam para resolver os problemas do povo e não apenas para lucro máximo das empresas.
5.        Construir novos métodos e novas formas de condução e de fazer política.
Sem hegemonismos, protagonismos, vanguardismos, com democracia participativa, etc.
6.             Construir um Projeto Popular para o Brasil, como programa estratégico que contribua na construção do socialismo.
a) Formar um grupo com representante de diversos setores, como intelectuais orgânicos, dirigentes para sistematizar o acúmulo que existe na classe e na sociedade.
b) Praticar a Pedagogia de massas, usando o projeto para construir com a base social, corrigi-lo e motivar as massas a lutarem.
7.             Retomar a formação política e a consciência soccial para avaliar a Luta de Classes corretamente.





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