Diante do fato que revela como o Estado trata os jovens e os pobres, nós do Cajueiro queremos manifestar nossa indignação a situação destes adolescentes e de tantos outros/as que vivem a mesma precariedade nos serviços públicos. Nossa solidariedade com os familiares.
Aqui apresentamos uma reflexão da professora Diane Vadez da luta pelos direitos dos adolescentes e parceira do Cajueiro nas lutas por melhor formação. Um texto que vale a pena ler...
Não sabia que a senhora mordia…’
Assim
falou um adolescente que cumpria medidas socioeducativas (em um espaço
que nem de longe é pra isso), para uma professora quando essa cobrou uma
tarefa escolar. Depois, confessou a demora, por não saber ler. E ali
estava, para ser ‘ressocializado’, sendo que nunca teve direito a
qualquer socialização em sua curta vida! A sordidez do Estado, começara
antes dele chegar ali. Começara na ausência do direito básico de todos
terem acesso às leituras que permitam acesso a todos os direitos. Não só
os fundamentais, pois direitos fundamentais, não transformam vidas. Não
mudam histórias! O dia em que a professora me contou sobre a ‘mordida’,
semana passada, rimos sobre a sacada (falei até que ia inserir no meu
vocabulário), e falamos o quanto o poder público os morde sem qualquer
culpa. Morde doído, com desejo sórdido de arrancar o pouco que ainda
carregam de perspectivas.
Ontem,
longe de casa, li sobre os adolescentes assassinados pelo Estado em um
espaço, já conhecido e denunciado, que nem de longe permite qualquer
mudança na vida de quem foi sempre ignorado. Daniel, Douglas Matheus,
Elias, Elizeu, Gabriel, Johny, Lucas, Wallace… nove adolescentes, sim
daqueles que tem nomes de meninos e que se parecem com os de sua
família, pois estão em condição de desenvolvimento, morreram queimados
em um lugar que, pela legislação, era para proteger e cuidar, permitindo
continuidade de suas vidas em outros formatos, apesar de saber que
ninguém segue nenhum caminho com os pés atados na violência submetida
diariamente.
Nove
adolescentes morreram asfixiados, queimados, presos e desesperados. Cada
um com seus nomes, famílias, tamanhos e motivos de ali estarem para
serem mais punidos por sua pele e sua condição social. Sim, são negros e
são pobres! Seus corpos foram empilhados feito sacos de qualquer coisa.
Foram empilhados para ‘limpar’ o espaço daqueles ‘estorvos’. Nove
adolescentes, sob a responsabilidade do Estado, foram mortos pela
responsabilidade nunca assumida. A imprensa protege o Estado com a
competência que tem se especializado ainda mais nesses tempos de golpe.
Protege, justifica, cuida, afaga e abraça um Estado que matou, agorinha,
nove adolescentes pobres.
A
culpa é deles! Foram eles que se mataram! Violentos que sempre foram,
até pra morrer eles tramaram! Procuraram seus fins! Não iam mudar mesmo!
Foi melhor assim!
Já o Estado, ah, o nosso
Estado do cerrado, não tem nada a ver com isso! Pois cumpriu, com sua
competência perversa, seu papel de proteger a ‘sociedade’, privando,
confinando, isolando, prendendo, encarcerando meninos e meninas que
ousaram, ‘sem mais nem menos’, confrontar a lei dos cidadãos de bem. E
por falar nesses, que são os mesmos que defendem a pena de morte e
acorrentamento de meninos pobres, seguem rezando, orando, cultuando
santos, cantando hinos de olhos fechados, falando mecanicamente ‘vai, ou
fica, com dels’, ecoam, aliviados e convictos:
...Graças a dels, menos nove….
O Estado morde, e a sociedade de bem, arranca e dilacera o que resta… Graças a dels…
(Diane Valdez - maio de mais dor)
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