Os quatro caminhos da redução da maioridade penal
Senado pode mudar punição para jovens menores de 18 anos. Do que estamos abrindo mão ao pregar que as falhas na formação da juventude sejam corrigidas de uma forma que, como já ficou provado, não funciona e é apenas vingança?
Conversei
com deputados e senadores preocupados com o rumo que estão tomando as
discussões sobre a maioridade penal após a tentativa fracassada de
aprovar propostas que reduziriam a idade mínima para que jovens fossem punidos como adultos na
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, em
fevereiro. Eles me ajudaram a organizar quatro caminhos possíveis:
Opção 1: Muita
discussão, debates, xingamentos, ameaças, mas tudo se mantém como está.
Nós jogamos a molecada dentro de depósitos de gente por alguns anos,
onde eles realmente aprenderam como cometer crimes e desprezar a vida
humana, e daí eles saem para serem presos novamente no futuro. Ou matam e
morrem no meio do caminho.
Opção 2: A
proposta de emenda constitucional que abre a possibilidade do
Ministério Público requerer à Justiça que jovens entre 16 e 18 anos
sejam julgados como adultos em casos que envolvem crimes hediondos (como
o tráfico de drogas e tortura), é levada ao plenário do Senado Federal e
aprovada. Uma série de propostas com esse teor, entre elas, essa PEC,
foram derrotadas na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania em 19
de fevereiro. Mas com a anuência de uma parte dos senadores (o que ela
já tem), pode seguir ao plenário.
Opção 3: A
base do governo está estudando uma alternativa à PEC, mas o resultado
pode ser até pior. A ideia seria estender o tempo de internação de um
jovem com menos de 18 anos de idade. Hoje, o limite é de 21 anos, mas
discute-se tetos de idade maiores que esse. Há um acordo com a direção
do Senado de que a opção 2 não vá à votação enquanto a opção 3 não
estiver estruturada.
Após
os 21, esse jovem em conflito com a lei não ficaria internado nas
unidades de ressocialização existentes, mas seria criada um novo tipo
delas exatamente para abrigar essa nova faixa etária e não ir contra a
legislação. Ou seja, se uma prisão fosse uma “universidade”, essas
unidades seriam as “escolas de ensino médio”.
O
problema é que como não há pena a se cumprir em uma unidade de medidas
socioeducativas (sic), do tipo Fundação Casa, e a permanência do
indivíduo depende de uma avaliação periódica da instituição, o jovem
poderia ficar preso em regime fechado por mais tempo do que se ele
estivesse sendo “julgado” com base no Código Penal, como adulto. Pois a
ele não seria dado o direito a progressão para um regime semiaberto, por
exemplo.
Nesse sistema, haveria um piso e um teto de internação. Ou seja, haveria uma “pena” – o que não pode existir hoje.
Dada a quantidade de problemas nessa proposta, a base do governo (sic)
incumbiu um grupo de senadores para montar uma alternativa. Contudo,
como estamos em ano de eleição (e especialmente em uma eleição em que a
questão da segurança pública será central como já disse aqui), isso vai
preocupar senadores que devem tentar a reeleição ou a disputa a outros
cargos. Alguns deles ficaram apreensivos com a resposta de alguns
eleitores após a negativa à PEC na CCJ em 19 de fevereiro.
Opção 4: Colocar
o sistema atual de ressocialização de jovens para funcionar de verdade,
transformando esses depósitos de gente em uma estrutura que faça com
que eles possam refletir sobre o que fizeram e dar os primeiros passos
para o seu futuro. Essa é a opção fantasiosa, cuja possibilidade de
acontecer no curto prazo é menor do que um meteoro devastador atingir o
planeta.
Essa
opção inclui explicar aos eleitores, se necessário, que como senador ou
senadora sua função é não apenas representar os interesses de quem o
elegeu, mas também garantir a proteção e à dignidade da infância e da
adolescência. E, por mais raiva ou dor que sintamos ao perder um ente
querido ou sofrer violência em uma situação envolvendo jovens com menos
de 18 anos, as perguntas que temos que fazer é se essas mudanças
realmente tornariam a sociedade mais segura. Ou se são apenas formas de
dar respostas fáceis de serem deglutidas por uma população atemorizada
pela violência, mas também pelo discurso da violência – que dá muita
audiência.
As
unidades de ressocialização, do jeito em que estão, não reintegram,
apenas destroem. A prisão, então, nem se fala. Mandar um jovem para lá e
desistir dele pode significa que, daqui a 30 anos, ele volte e desconte
em tudo e em todos.
***
E
se jovens de 14 começarem a roubar e matar, podemos reduzir a idade
mínima para prisão também. E daí se ousarem começar antes ainda, 12. E
por que não dez, se fazem parte de quadrilhas? Aos oito já sabem
empunhar uma arma. E, com seis, já se vestem sozinhos.
Ninguém
está defendendo o crime, muito menos bandidos. Até porque, adolescentes
em desacordo com a lei são internados até 21 anos e ficam por lá. O que
está em jogo aqui é que tipo de sociedade estamos nos tornando ao
defendermos a redução da maioridade penal.
Pelo
menos em teoria, protegemos os mais jovens – que ainda não completaram
um ciclo de desenvolvimento mínimo, seja físico ou intelectual, a fim de
poderem compreender as consequências de seus atos.
Decretamos
a falência do Estado e a inviabilidade do futuro e assumimos o “cada um
por si e o sobrenatural por todos”? Do que estamos abrindo mão ao
pregar que as falhas na formação da juventude sejam corrigidas de uma
forma que, como já ficou provado, não funciona, é apenas vingança?
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