O desabafo de Florestan Fernandes Jr.
"Nós, jornalistas, estamos de luto. A família de Santiago Andrade está de luto. Não nossos patrões que fazem do jornalismo um espetáculo dos horrores. Que colocam na frente das câmaras âncoras despreparados e irresponsáveis que vomitam seus preconceitos e ódios"
Florestan Fernandes Jr
Apenas um desabafo de um jornalista de televisão
“Vai
ser rápido, três takes”, foi o que disse Santiago ao sair da redação. A
expressão banal usada com frequência por repórteres e cinegrafistas
quando têm a tarefa de gravar um assunto que não demanda muito tempo,
agora merece uma longa e demorada reflexão.
Morreu
um companheiro de trabalho, jornalista de frente, da cobertura pesada
das ruas, vielas e palácios suntuosos do país. Morreu um repórter do
cotidiano, que colocava sua vida em risco quase que diariamente na nobre
tarefa de informar. Com suas imagens ajudou a aumentar a audiência de
telejornais. Certamente nunca teve o reconhecimento financeiro de seu
importante trabalho. Como todos os colegas de profissão, tinha um
salário miserável pelo risco que corria.
Mas
isso não é mais importante. Ele já está morto. Morreu registrando as
cenas de barbárie de um país que, pela primeira vez, se olha no espelho e
vê refletido um rosto marcado pelas cicatrizes de centenas de anos de
abandono e descaso. De um país de poucos, de uma justiça para poucos, de
terras nas mãos de poucos, da educação para poucos, de riqueza para
poucos. Um país de uma elite arrogante, perversa e preconceituosa, que
por séculos controla a política em todos os níveis; estadual, municipal e
federal.
Nós
jornalistas, sim, estamos de luto. A família de Santiago Andrade está
de luto. A sociedade brasileira mais uma vez está de luto. Não nossos
patrões que fazem do jornalismo um espetáculo dos horrores. Que colocam
na frente das câmaras âncoras despreparados e irresponsáveis que vomitam
seus preconceitos e ódios. Jornalismo de baixo nível que usa e abusa do
sensacionalismo para garantir audiência. De “âncoras” desafiando o bom
senso todos os dias com um pensamento esquizofrênico e preconceituoso.
Um jornalismo travestido de notícia que manipula dados, denúncias e, em
vez de levar conhecimento, cultura e educação, faz da noticia um
controle de mentes.
São
os Black bloc da comunicação. Ajudaram e continuam ajudando a destruir
os valores mais importantes da cidadania e de justiça social. Tudo
cinicamente justificado pela liberdade de expressão. Tudo para manter o status quo de uma elite atrasada e mesquinha que realmente não quer abrir mão de seus privilégios.
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